Em Wytches acompanhamos a história da família Rooks que, após um incidente cercado de mistérios envolvendo a filha do casal Charlie e Lucy, decide se mudar para a cidade de Litchfield, em New Hampshire. Por sua vez, Sailor (ou Sail como é chamada na maior parte do tempo) é uma garota vítima em sua antiga escola que acabou presenciando a morte repentina e enigmática da valentona.

Mesmo com a mudança, Sail ainda carrega muita culpa sobre o que aconteceu – algo que faz aumentar ainda mais suas inseguranças, medos e sua introspecção. Porém, na escuridão da floresta que cerca a cidade, existe um mal que vai muito além dos seus pensamentos, algo que busca resgatar aquilo que lhe foi jurado. As Brvxas existem e não vão deixá-la em paz enquanto não tiverem o que desejam.

Wytches, de Scott Snyder e Jock

Resenha | Wytches, Scott Snyder - Darkside Books
Wytches | Darkside Books (2017)

Uma das coisas que mais me chamou a atenção quando comecei a ler Wytches, de Scott Snyder, com artes de Jock e cores de Matt Hollingsworth, foi os incontáveis elogios que a HQ recebera desde seu lançamento.

A minissérie de horror publicada originalmente entre 2014/2015, pela Image Comics, chegou ao Brasil em 2017 pela Darkside Books, numa edição encadernada compilando os seis volumes originais. Automaticamente, foi ovacionada por aqui também. O trabalho que inaugurou as publicações de quadrinhos da editora recebeu inúmeros elogios na época e, mesmo agora, depois de quase 7 anos, ainda é alvo de críticas positivas dos leitores. Entretanto, depois de ler (e reler duas vezes), cheguei a conclusão de que não partilho da mesma empolgação com a obra. Na verdade, sinto que pouca coisa nesse trabalho me agradou verdadeiramente.

Um dos pontos mais fortes, na minha visão, é a mitologia que o autor criou para a base da história. Realmente, você fica bastante intrigado para descobrir o que são essas criaturas antigas, detentoras de um poder maligno capaz de tornar qualquer coisa realidade, dar a vida eterna, curar doenças, etc. Como Snyder comenta nos extras, as Brvxas possuem conhecimentos herbais antigos e, por serem entidades primitivas, ninguém sabe ao certo a extensão do seu poder. Tudo o que se conhece sobre elas vêm de lendas regionais ou boatos que os protagonistas desconhecem – o que os torna o fio condutor para explicar aquele universo ao leitor menos expositivo, uma vez que os personagens também estão aprendendo sobre a mitologia.

O conceito das criaturas em si também é muito bem desenvolvido. Desde o visual das Brvxas, que possuem seus olhos nas laterais da cabeça, são enormes e têm uma anatomia meio amálgama a de componentes da natureza, quase como se fossem partes vivas das árvores que moram, até mesmo sua mística e poderes que, nas lendas, parecem ser quase como seres divinos com poderes ilimitados, mas que na prática se mostram agir mais como animais famintos (um detalhe sutil, mas que mostra como ninguém, de fato, sabe tudo sobre elas).

Nesse ponto a HQ é sensacional, pois te instiga a querer mais, avançar mais na trama. Até me lembrou um pouco a construção de mitologia de When Evil Lurks. Como falei na crítica do filme, é muito bom quando os elementos são trabalhados de forma orgânica na narrativa, apresentando um universo conciso e cheio de camadas que podem ser exploradas futuramente. 

Contudo, diferente do filme de Demián Rugna, é aqui onde um dos problemas mais latentes de Wytches começa a aparecer. Apesar da mitologia interessante, em momentos-chave para a trama, as regras pré-estabelecidas desse universo são quebradas só para gerar facilitações no roteiro ou mesmo criar reviravoltas fracas e previsíveis.

Ao meu ver, muitas situações são construídas apenas para que o roteiro se encaixe melhor ou que haja mais momentos de horror gráfico, e que são meio abandonados posteriormente. Um exemplo acontece logo na primeira edição onde vemos uma personagem transformada em Brvxa aparecer para Sail. Entretanto, em nenhum momento é dito que as criaturas transformam suas vítimas depois de capturá-las, mas sim que às devoram (inclusive, vemos as consequências daqueles que acabam sendo jurados na personagem Clara). Por esse e outros momentos, acredito que o autor se perca um pouco em definir as regras daquele universo e, bem ou mal, acaba criando alguns “furos” que poderiam ser facilmente contornados em poucas linhas de diálogos.

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Na maioria das vezes, quando acontece esse tipo de situação, eu tento relevar e seguir com a resenha avaliando a obra de modo geral. Entretanto, acredito que em Wytches isso pode atrapalhar a experiência do leitor – até porque, uma das principais reviravoltas do quadrinho pode ser facilmente prevista em suas primeiras páginas. Eu coloco a culpa desses “problemas” no autor, pois ele é o responsável por definir a narrativa escrita e visual que, por aqui, não são nada discretas. E isso quer dizer que os vilões sempre estão sendo retratados no meio das sombras ou têm diálogos clichês que tentam avisar sobre os riscos da cidade.

Além disso, o desfecho pode desagradar alguns leitores que, assim como eu, vão ficar sem entender o motivo de tantas voltas e segredos para chegar em lugar nenhum. Eu terminei todas as três leituras me perguntando: não era mais fácil os vilões só terem feito isso no começo? De qualquer forma, não fazem e, mesmo com uma trama bacana, os problemas e furos na narrativa atrapalham bastante a experiência.

Nos extras Snyder abre um pouco do seu coração e conta como esse é um projeto bastante pessoal, como depositou muito dos traços da sua própria personalidade nos protagonistas, incluindo seus medos e frustrações. Acho que isso até ajuda a entender algumas das suas escolhas ao contar a história, como a mudança de perspectiva entre o pai e a filha e até a intercalação de textos que faz em vários momentos. A ideia pode ser até boa, mas a execução deixa o argumento mais complexo do que precisava, indo e voltando no tempo toda hora só para explicar como a ligação de ambos se tornou mais forte. No começo, pode até parecer promissor, mas logo você vê que meio que não importa muito – são PAI E FILHA, claro que se importam um com o outro e vão fazer de tudo para se salvarem. Não precisa de um marco triste em suas vidas.

Por esses motivos, acredito que a trama perca muito do seu potencial. O que poderia ser uma baita história de horror se prova ser um emaranhado de boas ideias guiadas por um fio condutor frágil, onde qualquer leitor desatento pode tropeçar e perder o interesse rapidinho pelo desfecho.

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Em contrapartida, a arte de Jock se encaixa muito bem na proposta da minissérie, com desenhos estranhamente hipnotizantes que te mergulham naquele mundo e fazem você comprar toda a estética criada para a cidade, seus habitantes, florestas e as Brvxas.

Os desenhos em nanquim com as cores de Matt Hollingsworth ainda são cobertos por uma camada de respingos de aquarela, feitos em papel, escaneados e tratados por meio de ferramentas de desenho digital e, combinados com o restante, dão um charme bem diferenciado para a obra. Talvez os desenhos dividem opiniões entre os leitores. Eu gostei, mas entendo aqueles que não curtiram muito e acredito que essa seja até mesmo a proposta do artista. 

E para finalizar meu veredito, quero falar um pouco da publicação nacional que conta com as seis edições da minissérie compiladas em um encadernado capa dura de 192 páginas. Na parte dos extras, além das cartas do autor que foram publicadas no final de cada volume individual, a Darkside também trouxe alguns estudos de personagens, artes de divulgação e composição de quadros. Não é muito conteúdo, mas é um material interessante.

Se vale a pena a leitura? Vale sim. Não é o melhor trabalho do Snyder, tem todos os pontos negativos que citei antes, mas é uma história legal, a mitologia é interessante e tudo indica que haverá mais publicações nesse universo. O autor revelou que tinha planos para lançar a sequência em 2016, mas o arco até agora está no limbo e não encontrei muitas novidades sobre. Porém, houve um one-shot de 80 páginas chamado Bad Egg – ainda não li, mas parece seguir outros personagens, outra trama, etc. Se tiverem interesse, posso resenhar depois.

Costumo dizer que Wytches é o típico quadrinho de promoção. Não digo para ninguém comprar com o valor cheio, que é de R$ 69,90. Espera um pouco, direto aparece em alguma promoção da Amazon com um desconto agressivo. Agora se você não quiser esperar, dê uma olhada nos links abaixo.


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Nota
resenha-wytches<b>Título:</b> Wytches <br> <b>Autores:</b> Scott Snyder, Jock <br> <b>Editora:</b> Darkside <br> <b>Páginas:</b> 192 páginas <br> <b>Gênero:</b> Horror, Graphic Novel <br> <b>Ano de publicação:</b> 2017 <br> <b>Classificação Etária:</b> 16 anos