Se ano passado a HBO estava nos holofotes por conta de House of The Dragon, derivado do sucesso absoluto Game of Thrones, este ano o hype veio cedo, já que a próxima grande produção em sua esteira de lançamento era The Last of Us; série baseada no game de mesmo nome, lançado em 2013 pela Naughty Dog.

O primeiro episódio, intitulado When You’re Lost in the Darkness, foi lançado no dia 15 de janeiro e, mesmo sob diversas reclamações de instabilidade no serviço de streaming, as reações do público e críticos no mesmo dia foram as melhores possíveis.

the-last-of-us-1x01-01-Joel-e-Ellie
Crítica | The Last of Us – Joel e Ellie

E não é para menos, visto que a produção se apoia num formato de adaptação fidedigno ao visto no game, com apenas mudanças coerentes com mídia para a qual foi transposta – um ponto que ajudou a assegurar que os únicos deslizes notáveis tenham sido relacionados às escolhas da direção.

A série já está se encaminhando para o final, porém, decidi trazer a análise por episódios para tentar convencer você que ainda não viu dar uma chance para essa produção que promete dar as caras em todas as premiações de 2023.

Mas para entender o motivo de The Last of Us estar conquistando tanta gente, domingo após domingo, precisamos começar de início. O que está chamando tanta atenção para essa adaptação?

Mente aberta para uma nova perspectiva

A primeira mudança em relação ao conteúdo original aparece logo começo do episódio, com uma cena de introdução que se passa em 1968, onde vemos uma entrevista de dois epidemiologistas falando sobre a possibilidade de uma catástrofe mundial com potencial de destruir a humanidade.

Após discutirem a periculosidade de bactérias e vírus, um deles dá início a um monólogo onde explica que apenas uma pandemia causada por fungos teria poderio suficiente para nos vencer; estando ela a apenas um passo evolutivo de acontecer.

Acredito que essa cena específica tenha sido o maior acréscimo da série neste episódio. Além introduzir o tema para aqueles que não jogaram The Last of Us conseguirem se ambientar nesse universo pós apocalíptico com criaturas diferentes dos zumbis tradicionais do cinema, ainda serve para implementar uma seriedade maior ao tema abordado, uma vez que usa fungos reais como exemplo, incluindo o próprio cordyceps.

Essa cena ainda ganha uma camada extra de profundidade depois do que o mundo passou com a pandemia de COVID-19. E, sabendo disso, o roteiro ainda nos dá alguns segundos para digerir o que vamos ver a partir dali e nos prepararmos para ser jogado contra situações tensas e dramáticas que, guardadas as devidas proporções, experimentamos uma parte na vida real.

Logo em seguida somos levados para 2003 e apresentados aos personagens Joel (Pedro Pascal), seu irmão Tommy (Gabriel Luna) e sua jovem filha Sarah (Nico Parker) em um momento bem semelhante ao que vemos no jogo, mas que acaba se estendendo por boa parte do episódio – outra mudança super bem-vinda, pois expande aquilo que já conhecíamos e permite que seu desenvolvimento consiga entregar mais detalhes sobre os personagens.

A relação entre pai e filha é bem explorada, assim como os sutis indícios de que há algo errado acontecendo, que acabam sendo mais acentuados na série – tanto pela presença de aviões do exército nos céus da cidade de Austin, no Texas, e no policiamento agitado nas ruas, quanto pelas intervenções discretas de comentários nos noticiários sobre um tumulto que começou em Jacarta, Indonésia.

Quando a catástrofe em si atinge a região em que a família mora, voltamos às semelhanças com o jogo e temos início ao primeiro real momento de tensão, onde acompanhamos a Sarah se levantando da cama de madrugada desnorteada, saindo de sua casa e vendo seus vizinhos infectados.

Esse momento conta com uma referência muito bacana para fãs de games, pois faz aquela piscadela para outro grande título do gênero de terror com zumbis. É possível ver que o enquadramento utilizado para mostrar o infectado e o movimento que faz ao olhar para frente é bastante parecido com o icônico zumbi de Resident Evil, de 1996.

Em seguida, Joel e seu irmão chegam para salvar Sarah, mas sua tentativa de fuga é frustrada graças ao caos que a cidade se encontra. Mais um momento semelhante ao jogo, com muitas coisas acontecendo em tela ao mesmo tempo e um desfecho trágico semelhante ao jogo.

Após a belíssima abertura da série, que apresenta a trilha sonora original remixada, temos mais um salto de tempo. Dessa vez, após 20 anos (2023), somos levados à Boston, onde podemos ver que a humanidade já está melhor estabelecida, porém, ainda aprendendo a viver com as consequências da epidemia.

Uma instituição federal de controle ao avanço da contaminação chamada FEDRA é responsável pelas “zonas de quarentena”, que de maneira autoritária, determina regras sociais para as pessoas que vivem nesses distritos, oferecendo trabalhos de manutenção e controle em troca de pagamentos.

Aqui percebemos que o sistema econômico, por mais que precário, ainda existe. Assim como a punição de prisão ou morte para aqueles que não atendem o toque de recolher ou mesmo decidem sair das limitações das zonas de quarentena.

E por conta disso, também existem aqueles que buscam lucrar mais através de serviços mais difíceis ou mesmo ilegais, como é o caso de Joel e Tess (Annie Wersching), contrabandistas de mercadorias e drogas, como comprimidos de ocitocina.

Depois de apresentar outros conflitos que permeiam aquele universo, como a milícia rebelde conhecida como Vaga-lumes e contextualizar sua guerra contra o autoritarismo da FREDA, Joel acaba conhecendo a jovem Ellie (Bella Ramsey) e aceita a difícil missão de levá-la até um outro grupo fora da zona de quarentena, que pode encontrar na criança a esperança para mudar o destino da humanidade.

Adaptação (quase) perfeita

Em termos de roteiro, se você conhece o jogo de 2013, percebeu que a estrutura não é apenas semelhante, mas essencialmente a mesma do material original. Não senti falta de nada que fosse importante estar naquele universo.

Mesmo a série optando por não adaptar a infecção por esporos, que é uma das formas de contaminação presentes no jogo, não faz falta aqui. Acontece que já existem tantas tramas e subtramas e coisas acontecendo, que de fato não faria sentido adicionar mais um percalço à jornada dos protagonistas.

Fora que isso também permitiu que o roteiro explorasse com mais detalhes como funciona a infecção do cordyceps, detalhando tempo que leva para a infecção tomar conta do hospedeiro de acordo com o local da mordida. Quanto mais perto do cérebro, menos tempo de vida a pessoa tem (variando de 5 minutos até 24 horas).

Outra mudança benéfica para o roteiro foi ter focado neste primeiro episódio para destacar a relação entre Joel e Sarah. Quem jogou o game sabe que essa introdução, além de ser bastante delicada, é responsável por determinar a personalidade do protagonista ao longo da jornada – incluindo sua relação com a Ellie, que no começo, é tratada apenas como uma encomenda.

Sendo assim, a série acertou em cheio por dedicar metade deste primeiro episódio ao passado de Joel. Neste momento, também podemos ver outras mudanças que deverão ser melhor trabalhadas no futuro, como uma menção ao Tommy ser um veterano de guerra; uma provável justificativa para se aliar aos vaga-lumes, posteriormente.

Infelizmente, não tivemos muito tempo da Ellie em tela, então não dá para dizer ao certo quais são suas principais mudanças nesta adaptação. Mas pelo que pudemos ver da atuação da Bella Ramsey nos poucos minutos que teve, sua escolha foi perfeita. Não só pela facilidade em interpretar uma garota com postura forte, como já tínhamos visto em Game of Thrones quando deu vida a Lyanna Mormont, mas sim pela facilidade de atuar sendo uma menina de 14 anos, que tem seus momentos de explosão e sarcasmo, mas que ao mesmo tempo, tem a inocência de estar conhecendo o mundo pela primeira vez.

Em relação às atuações, não tem muito o que se destacar, já que o trabalho de todos ali estão entregando aquilo que se espera desses personagens. Vimos o trabalho de Troy Baker, Ashley Johnson e todos os outros atores que fizeram o jogo, então não esperava algo muito longe do que foi feito.

Não entenda isso como uma crítica, pois não é. Todos estão muito bem na série. Só reforcei a ideia de que não há nada de destaque, justamente pelo fato de estarem entregando aquilo que esperávamos.

Se tem um ponto que tenho para falar da atuação é sobre a escolha de postura do Joel antes do acidente com sua filha. Gostaria de ter visto mais do personagem feliz, despreocupado, para que quando houvesse a mudança de tom em sua personalidade, a gente sentisse o que os anos vivendo com as suas memórias foram capazes de fazer com um homem bom. Mesmo assim, nada que atrapalhe a narrativa,

Agora um ponto que realmente me incomodou durante o episódio foi a escolha de certos enquadramentos que simulam o jogo, mas que ficaram bem estranhos quando aplicados na série.

Em determinado momento, os personagens pegam a estrada de carro e a câmera os acompanha dentro do veículo – igualzinho ao game. Claro que isso é uma referência ao jogo e tudo mais, mas espero que não fiquem fazendo isso ao longo dos próximos episódios.

No meu caso, senti que esses momentos me tiravam da imersão da cena e eu ficava pensando no jogo. Novamente, essas coisas não chegam a atrapalhar a experiência, mas se a proposta é fazer uma boa adaptação, algumas escolhas devem ser repensadas para fazer com que a audiência não perca sua atenção ao ficar fazendo comparativos desnecessários a todo momento.

É legal quando as falas são semelhantes ao que vimos no jogo, ou quando os personagens passam por cenários idênticos, mas quando algo força esse comparativo (mesmo que só um pouco) o risco de fazer com que seu público volte o pensamento para a obra original é alto.

the-last-of-us
Crítica | The Last of Us – Joel e Ellie

No geral, The Last of Us é uma promissora série que está com sua segunda temporada confirmada, desde o seu lançamento – tamanho é o sucesso que se esperava dessa produção.

As expectativas para que a adaptação do game seja uma das melhores já feitas também é enorme, ainda mais depois da bomba que Resident Evil teve nos últimos dois anos com produções ridículas e de extremo mal gosto com os fãs.

Aqui o cuidado está sendo tanto que até a dublagem em português foi feita pelos mesmos atores que dublaram a obra original em 2013.

Como eu disse lá no começo, a fidelidade com o material que as pessoas já conhecem tem sido a principal aposta para essa mega produção que ainda deve arrancar muitas lágrimas dos olhos de todos.

The Last of Us tem seus novos episódios disponibilizados todos os domingos, a partir das 23hs, na HBO Max.